quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Educação Musical em Perspectiva Histórica (mesa redonda)

Convido a todos para assistirem à mesa-redonda sobre Educação Musical em perspectiva Histórica, no 2o Simpósio Villa-Lobos.

Será dia 24 de novembro, às 14h, na ECA-USP

Nós vamos utilizar a perspectiva biográfica e alterar o foco: em lugar de biografar Villa-Lobos, vamos analisar como ele se relaciona com outros educadores musicais.

Esperamos por toda a comunidade acadêmica ligada à história e à educação.
Veja os temas e resumos aqui. 

Partipantes: Eu, Susana Cecilia Igayara, vou falar das mulheres professoras como um todo, destacando a atuação e produção escrita de algumas delas. Jane Borges fala sobre Vieira Brandão e Inês Rocha, sobre Liddy Chiafarelli Mignone.

Programação oficial:


PROGRAMAÇÃO OFICIAL DO II SIMPÓSIO VILLA-LOBOS 2012

SEXTA-FEIRA, 23 DE NOVEMBRO DE 2012
Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.
Avenida Lucio Martins Rodrigues, 443.
Auditório Lupe Cotrim (1º Andar do Prédio Central da ECA)

08:00h – Credenciamento
09:30h – Abertura
10:00h – Mesa 1: Brancas & Pretas: o piano de Villa
Eduardo Monteiro: Sinais de acentuação na obra Impressões
Seresteiras de Villa-Lobos
Luciana Sayuri: Cirandinhas: princípios texturais em Villa-Lobos
Nahim Marun: Paradigmas semântico-musicais nas canções para
voz e piano de Heitor Villa-Lobos: propostas para uma interpretação

12:00h – Almoço

14:00h – Seminário 1:
Marcus Wolff: Villa-Lobos nos anos vinte: do modernismo
universalista à busca da brasilidade
Lina Noronha: Darius Milhaud e Villa-Lobos: identificações
Marco Antônio Toledo Nascimento; Adeline Stervinou; Danièle
Pistone: Similaridades entre o Brasil e a França sobre a história da
Educação Musical: O exemplo do movimento Orfeônico
15:30h – Palestra 1:
Roberto Duarte: Revisão das obras orquestrais de Villa-Lobos
16:30h – Intervalo
17:00h – Mesa 2: História, Nacionalismo e Identidade em Villa-Lobos
Mário Videira: Sobre a recepção de Villa-Lobos por críticos e
historiadores da música brasileira
Dorothea Kerr: A presença de Villa-Lobos em teses e dissertações
Acácio Piedade: Retoricidade, intertextualidade e tópicas na música
de Villa Lobos
19:00h – Concerto 1:
Programa
Canção do Poeta do Século XVIII
Na Paz do Outono (Seresta no 6, 1926)
Melodia sentimental
Estudos nos 11, 1 e 4 (violão solo)
Lundu da Marquesa de Santos (1940)
Cantiga do Viúvo (Seresta no 7, 1926)
Canção do Amor (Floresta do Amazonas, 1958)
Fábio Miguel (barítono) e Luciano Cesar Morais (violão)
Bachianas Brasileiras no 6 (1938)
Ária (Choro) e Fantasia
Toninho Carrasqueira (flauta) e Fábio Cury (fagote)

SÁBADO, 24 DE NOVEMBRO DE 2012
Departamento de Música (CMU)
Rua da Reitoria, Auditório George Olivier Toni.

09:00h – Seminário 2:
Silvio Moreira: O problema da audibilidade de estruturas sonoras
simétricas
Yuri Kimizuka: Desmontando a caixinha de música quebrada de
Villa-Lobos
Joel Albuquerque: Choros no 4 e no 7: dois procedimentos diferentes
envolvendo o uso de eixo de simetria como fator estrutural
Gabriel Ferrão Moreira: Diatonismo, pentatonismo e octatonismo e
suas interações no Choros no 10 de Villa-Lobos
11:00h – Mesa 3: Sinfonizando o Brasil: Coro & Orquestra
Lutero Rodrigues: Considerações sobre a interpretação do Choros
no 7
Marco Antônio da Silva Ramos: Missa São Sebastião: unidade,
rapsódia ou engenho?

12:30h – Almoço

14:00h – Mesa 4: Educação Musical em Perspectiva Histórica
Susana Igayara: As professoras de música na época de Villa-Lobos
Inês de Almeida Rocha: “Que mistura é este Villa! Digno de um
estudo muito profundo!”: algumas aproximações e distanciamentos
entre as propostas de educação musical de Liddy Chiaffarelli Mignone
e Heitor Villa-Lobos
Jane Borges: Vieira Brandão (1911-2002): discípulo, assessor,
intérprete e amigo de Villa-Lobos

16:00h – Palestra 2:
Leopoldo Waizbort: Os índios de Villa-Lobos
17:00h – Intervalo
17:30h – Mesa 5: Por uma Estética da Escuta: as paisagens sonoras de
Villa
Rogério Costa: O cavalinho de pau: devir-criança e devir-molecular
na obra de Villa Lobos
Didier Guigue: Villa-Lobos: pistas para uma escuta historicamente
informada
Carole Gubernikoff: A escuta e a escuta de obras de Villa Lobos
19:30h – Concerto 2: Alunos do Departamento de Música da ECA/USP
Programa
Suíte Popular Brasileira
Valsa-Choro (1912)
Estudo nº 8 (1929)
Juliana Vasques (violão)
Prelúdio nº. 4 (1940)
Estudo no 11 (1929)
Suíte Popular Brasileira
Chorinho (1923)
Vinicius Nogueira da Silva (violão)
Floresta do Amazonas (1958)
Veleiro
Cair da tarde
Canção de amor
Melodia sentimental
Duo Brasiliana

DOMINGO, 25 DE NOVEMBRO DE 2012
Departamento de Música (CMU)
Rua da Reitoria, Auditório George Olivier Toni.

09:00h – Seminário 3:
Julia Tygel: Choros no 10: o uso composicional do tema indígena
Pareci
Alexandre Rosa; Sonia Ray: Partes de Contrabaixo das Sinfonias de
Villa-Lobos: uma discussão sobre idiomatismo
Antônio Marcos Souza Cardoso: Procedimentos interpretativos
para
o naipe de trompete no Choros no 6
10:30h – Mesa 6: As canções de Villa
Achille Picchi: As duas Janonesas de Heitor Villa-Lobos
Luiz R. Ballestero: O conceito de persona e suas representações
instrumentais em obras vocais de Villa-Lobos
Martha Herr: As canções de Villa-Lobos antes de 1925

12:30h – Almoço

14:00h – Concerto 3:
Programa
Historiettes (1920):
Solidão (poesia de Ribeiro Couto)
Lune d'octobre (poesia de Ronald de Carvalho)
Novelozinho de linha... (poesia de Manuel Bandeira)
Hermione et les bergers (poesia de Albert Samain)
Jouis sans retard, car vite s'écoule la vie... (poesia de Ronald de Carvalho)
Le Marché (poesia de Albert Samain)
Epigramas irônicos e sentimentais (1922)
Sonho de uma noite de verão (poesia de Ronald de Carvalho)
Songe d'une nuit d'été (versão em francês do próprio compositor)
Canção de Cristal (1950, poesia de Murillo Araújo)
Martha Herr (soprano) e Achille Picchi (piano)
14:30h – Palestra 3:
Manoel Correa do Lago: “Works in progress” de Villa-Lobos nos anos
30 e 40
15:30h – Mesa 7: Nos limites da Análise
Rodolfo Coelho de Souza: A evolução das concepções de
tonalidade
e atonalidade na obra de Villa-Lobos
Maria Lúcia Pascoal: A Expansão da Sonoridade
Silvio Ferraz: Estudo da gênese composicional de Rudepoema de H.
Villa-Lobos
17:30h – Intervalo
18:00h – Concerto 4:
Programa
A lenda do caboclo (1920)
Improviso n. 7 (1915)
Eliane Tokeshi (violino) e Ricardo Ballestero (piano)
Hommage à Chopin (1949)
Luciana Sayuri (piano)
Suíte para canto e violino (1923)
Menina e a canção
Quero ser alegre
Sertaneja
Eliane Tokeshi (violino) e Adélia Issa (soprano)

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Bibliografia selecionada para o estudo do Repertório Coral na Idade Média e Renascimento.

Comecei a publicar as bibliografias que tenho reunido em minha atividade didática. Comecei com a bibliografia que utilizei para um curso sobre Repertório Coral na Idade Média e no Renascimento. Infelizmente, este curso não existe mais no currículo da graduação em Música da ECA-USP. A nova orientação dos currículos pedia por cursos mais generalistas, e não especializados como os que ministrei no início de minha atividade na USP. Resolvi, no entanto, divulgar a bibliografia, pois nunca se sabe quando, onde e para quem os esforços já realizados por um professor serão úteis... veja aqui.

quinta-feira, 8 de março de 2012

As mulheres na história da educação musical no Brasil.


Minha reflexão sobre o dia das mulheres:

Durante quatro anos, pesquisei a produção escrita por mulheres sobre música. Esses textos de professoras-autoras mostraram-se parte de uma produção diversificada, muito ligada à prática do ensino de música nas escolas, nos conservatórios, nos cursos superiores e no ensino privado. Considero-me uma pessoa de sorte: fui orientada pela Cynthia Pereira de Souza (FEUSP) e tive em minha banca Maria Lúcia Speedo Hilsdorf (FEUSP), José Eduardo Martins (ECA-USP), Maura Penna (UFPB) e Aníbal Bragança (UFF/FBN). Na qualificação, além da Profa. Maria Lúcia estava Marta Maria de Chagas de Carvalho (FEUSP). Quem trabalha nas áreas de História da Educação, Musicologia, Educação Musical e História do Livro e da Leitura pode imaginar a qualidade da orientação, das arguições e dos comentários desses excelentes pesquisadores!

Usar a noção de “gênero” como categoria de análise e abordar toda a primeira metade do século XX foi um grande desafio. No final do meu trabalho, descobri 46 autoras com 100 títulos publicados. Isso não esgota a produção das mulheres nessa história da educação musical no Brasil, mas dá uma ideia do potencial explicativo, muito além das visões estereotipadas (principalmente sobre o canto orfeônico) que circulam mais amplamente. Isso porque essas fontes não estavam muito visíveis... Boa parte dos textos só podem ser achados em Bibliotecas, em acervos pessoais, ou perdidos nos catálogos dos sebos. Mas como, em pesquisa, uma fonte leva à outra, fui descobrindo e analisando essa produção. 

Alguns assuntos foram especialmente motivadores: a relação entre a educação recebida e a produção escrita; a     alternância entre a atividade docente e a atividade artística; a participação das mulheres nas atividades musicais, entre o amadorismo e o profissionalismo; a dinâmica da ocupação de espaços e da disputa de postos de trabalho nas carreiras musicais; a presença dos textos memorialísticos e das referências autobiográficas nos textos produzidos, apenas para citar algumas. Quantos assuntos que não se esgotaram na tese de doutorado e agora povoam minhas disciplinas na graduação,  motivam o oferecimento de uma disciplina de pós-graduação, fazem com que eu tente definir mais claramente os próximos projetos de pesquisa.

Aos que pensam que tudo acaba na defesa de doutorado, digo que não! O trabalho continua... Agora estou adaptando e revisando a tese para a publicação de artigos, preparando comunicações para congressos e ainda pensando se transformo parte dessa pesquisa em livro, para facilitar uma divulgação mais ampla. 

Adoraria também saber de outros pesquisadores que estão trabalhando com a história da educação musical, com a produção sobre música na história do livro e sobre a presença das mulheres nas práticas musicais, ao mesmo tempo em que me empenho em  motivar os jovens a pensarem e optarem pelo caminho da pesquisa sobre o repertório, sobre a produção escrita sobre música, sobre a história da educação e das práticas musicais no Brasil. 

Para quem encara a leitura acadêmica, a tese já está no banco de teses e dissertações da USP. link

sexta-feira, 2 de março de 2012

A nova fase da Revista Música (ECA/USP)

A Revista Música, publicada pela ECA-USP, foi fundada e teve como editor o professor titular José Eduardo Martins, pianista e musicólogo. Depois de sua aposentadoria, a revista foi interrompida e agora é retomada, tendo por editor o professor Mário Videira. Foi também associada ao Programa de Pós-Graduação. Como parte dessa retomada de uma publicação que teve grande colaboração internacional, foi feita a digitalização dos números anteriores. 

Incluí na página de minha produção acadêmica os links para os dois artigos que publiquei na Revista, um deles em 1999 e outro em 2006. Em 1999, eu estava totalmente mergulhada no estudo da obra de Claudio Monteverdi, ao mesmo tempo em que fazia meus estudos de mestrado sobre Henrique Oswald. É sobre a obra deste compositor brasileiro o artigo de 2006, já depois de cinco anos do término de meu mestrado sobre sua obra sacra coral. Monteverdi continua presente em minhas aulas de Repertório Coral na graduação em Música na ECA-USP.     Veja aqui

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Biografia e autobiografia na pesquisa em música


Nova disciplina na pós-graduação em Música

Neste primeiro semestre de 2012, estarei ministrando uma nova disciplina no programa de  pós-graduação em Música, como parte da área de concentração em Musicologia. Biografia e autobiografia na pesquisa em música (CMU5571) é uma disciplina de 7 créditos que será oferecida às 5as feiras, das 13h às16h. Está voltada aos pesquisadores que utilizam, em sua bibliografia, gêneros textuais ligados à produção biográfica e/ou autobiográfica como fontes de pesquisa. Também pretende auxiliar os pesquisadores que, por características de seus objetos de pesquisa, não dispõem de material biográfico crítico e atualizado sobre seus objetos de estudo e se deparam com a necessidade de produzir algum tipo de material biográfico, ou de divulgar textos autobiográficos inéditos produzidos pelos músicos que tomam por objeto. A relação autor-obra, por exemplo, merece ser analisada criticamente, o que é um dos objetivos da disciplina. A produção biográfica sofreu uma importante transformação a partir dos anos 1980 e ganhou um novo lugar nas pesquisas acadêmicas, principalmente a partir da discussão sobre memória e história. A disciplina Biografia e autobiografia na pesquisa em música (CMU5571) , portanto, pretende oferecer um quadro teórico de referência e auxiliar os pós-graduandos na utilização dos materiais biográficos e autobiográficos em suas pesquisas em música. Leia abaixo um detalhamento dos objetivos, programa e bibliografia a ser utilizada. 


PROGRAMA

OBJETIVOS:
  1. Fornecer ao aluno de pós-graduação em música fundamentos teóricos para a leitura e  análise de fontes biográficas e autobiográficas.
  2. Auxiliar o aluno na utilização de fontes em suas pesquisas, analisando diversos gêneros textuais ligados à produção biográfica e autobiográfica e discutindo as formas de citação e de aproveitamento desses materiais na pesquisa em música. 
  3. Discutir a preparação de textos que tenham como conteúdo principal a apresentação biográfica ou autobiográfica.
  4. Analisar, a partir da confluência dos estudos históricos, musicológicos e literários, diversos tipos de construções biográficas e autobiográficas, compreendendo-as a partir dos pressupostos de seu gênero textual e das circunstâncias contextuais de sua produção.
  5. Considerar as variações de sentido e de apropriação dos textos biográficos e autobiográficos a partir da alteração de seus suportes e protocolos de veiculação (por exemplo, de um discurso falado a um texto publicado, de uma entrevista ao romance biográfico, de um currículo artístico de divulgação à pesquisa acadêmica, entre outros).

JUSTIFICATIVA:

Uma busca nos títulos já defendidos na pós-graduação da ECA-USP, no campo específico da música, mostra um grande número de trabalhos voltados à análise de obras artísticas ou conjunto de obras, a partir da identificação de um autor (compositor) ou intérprete.

A disciplina Biografia e autobiografia na pesquisa em música propõe uma fundamentação teórica transdisciplinar que auxilie o pesquisador  em  sua análise da produção textual biográfica e dos distintos materiais com caráter autorreferencial, aí incluídas as autobiografias. As duas principais modalidades de abordagem do conteúdo biográfico estarão contempladas na disciplina: a análise crítica de textos biográficos ou autobiográficos e a produção textual (pelo pesquisador) de perfis, cronologias ou textos biográficos, a partir de material documental e/ou de fontes textuais.  O foco da disciplina será a produção textual. Fontes em áudio e vídeo, sobretudo entrevistas e documentários, cada vez mais abundantes, também poderão ser discutidas.

O modelo autor-obra é tradicional no estudo da música.  Lydia Goehr, em The imaginary museum of musical works, discute que tipo de objeto é uma “obra musical” e descreve a forma pela qual um determinado conceito de obra emergiu na prática da música clássica e passou a ser utilizado desde então. A partir de tal conceito de obra musical, em diferentes períodos históricos e com distintos pressupostos teórico-conceituais, são encontradas referências bibliográficas que partem do princípio de que a vida e a obra se explicam mutuamente.

Em seu texto inicial à História da Música no século XIX, Jim Samson discute essa proeminência da obra  sobre as práticas (The musical work and nineteenth-century history). Em outro texto, The great composer, Jim Samson aborda as histórias da música orientadas ao compositor, visto como gênio. Em suas reflexões sobre o século XIX, Samson demonstra o quanto a centralidade da obra está ligada à valorização do compositor e, posteriormente, do intérprete. Estes exemplos demonstram a importância de um aprofundamento sobre o biografismo, que proliferou na bibliografia musical a partir, justamente, do século XIX.

As pesquisas que abordam intérpretes e educadores musicais como objetos de pesquisa também demonstram a pertinência da discussão sobre o biografismo ligado aos estudos sobre música. O relato das atividades de um compositor, intérprete e/ou docente geralmente está concentrado nas atividades do biografado: seus estudos, as composições e/ou apresentações das obras artísticas, a atuação profissional, o repertório praticado, os deslocamentos geográficos em sua trajetória, o contato com outros artistas e com o meio intelectual, familiar, social e político são algumas das relações salientadas nos estudos biográficos.

A biografia, como gênero discursivo, tem uma longa história na cultura ocidental, e não raras vezes envolveu autores e biografados em polêmicas públicas. Entre estas polêmicas estão,  principalmente, aquelas relacionadas à discussão sobre a autoria e o ineditismo de propostas estéticas,  ou ainda as questões ligadas à privacidade e ao direito à informação. Muitas vezes, estas polêmicas se transformaram em verdadeiras disputas pela memória legítima, mais ou menos explícitas nos textos biográficos e autobiográficos.

Afastada da produção acadêmica durante muito tempo, por ter sido um gênero literário praticado por amadores, o gênero biográfico foi discutido, a partir dos anos 60 do século XX, por autores como Barthes, Foucault e Bourdieu. Para Bourdieu, nas “histórias de vida” há uma tendência à construção de uma falsa coerência e linearidade, responsáveis pelo que ele chama de “ilusão biográfica”. Barthes e Foucault investigam a função-autor, questionando a ênfase na valorização do indivíduo autônomo. Estes textos, incluídos na bibliografia, têm sido desde então discutidos e, em certa medida, foram responsáveis por uma reorientação nos estudos biográficos.

A partir dos anos 80, há uma renovação na escrita biográfica, que assume um novo lugar na cultura intelectual, em diálogo com as disciplinas do texto (literatura, crítica literária, análise do discurso, hermenêutica, entre outras) e as disciplinas históricas, sobretudo nas correntes derivadas da École des Annales e nas diversas linhas formadas a partir dos movimentos da Nova História e da História Cultural. Autores como François Dosse, Jacques Le Goff, Carlo Ginzburg e Giovanni Levi, entre outros, trouxeram novas abordagens metodológicas e novos usos de fontes de pesquisa. Produziram biografias que se tornaram referências em seus campos de estudo e que passaram a ser consideradas para além de seus objetos específicos, como parte de uma discussão ampla da presença do biografismo nas humanidades.

Ressalta-se, também, o papel dos jornalistas e da imprensa periódica na produção de perfis de compositores e intérpretes. Voltados para a discussão da atualidade e da novidade, os textos jornalísticos, a entrevista e a crítica musical são fontes importantes para algumas temáticas musicais, incluindo a discussão (auto)biográfica, sobretudo para os compositores e intérpretes eruditos e populares dos séculos XX e XXI.

Considerando-se que a abordagem biográfica há muito vem sendo praticada na pesquisa em música e que há um componente biográfico em grande parte dos projetos apresentados à pós-graduação,  entendemos que a disciplina tem uma contribuição a oferecer, na medida em que se propõe a discutir um conjunto abrangente de fontes de pesquisa e de práticas textuais. No caso mais particular da música brasileira, há uma grande quantidade de fontes a serem  analisadas, bem como objetos de estudo significativos ainda inexplorados.

A proposta desta disciplina vem ancorada em nossas pesquisas anteriores. Em nosso Doutorado em Educação, trabalhamos exclusivamente com impressos sobre música publicados como livros e consultamos grande quantidade de fontes biográficas e autobiográficas, utilizando a fundamentação teórica da História da Educação,  História Cultural e História do Livro e da Leitura, em diálogo com a Musicologia. Em nosso Mestrado em Musicologia, trabalhamos no formato autor-obra com concentração monográfica, apresentando revisão crítica da recepção do autor, análise musical e edição musicológica de um conjunto delimitado de obras (produção sacra coral de Henrique Oswald). Além desses dois trabalhos de pesquisa, a concentração nos estudos de repertório e uma constante leitura e análise de textos voltados à problemática “autor-obra” ou “intérprete-repertório” formam o quadro a partir do qual é proposta a disciplina.

CONTEÚDO (EMENTA):

A - Discussão teórico-conceitual como suporte aos projetos de pesquisa:  A biografia vista como gênero literário e como fonte de estudo em música, considerando-se a centralidade do binômio autor-obra nos estudos musicais (Samson). As críticas à (auto)biografia: o que é um autor (Foucault), a morte do autor (Barthes)  e a ilusão biográfica (Bourdieu). Tipologias das produções biográficas e história da biografia (Levi, Dosse).

B Memória e história: biografia e autobiografia como fontes de pesquisa.
 A Memória e a história (Le Goff, Ricoeur, Nora). Fontes biográficas e seu uso (Levi, Viñao Frago): biografias de compositores, intérpretes e professores; dicionários biográficos; polianteias; entrevistas e documentários; currículos artísticos; perfis e escorços biográficos. A autobiografia e outros gêneros autorreferenciados: diários, cartas, memórias e memoriais institucionais. Discussão sobre a produção dessas fontes (Certeau) e as alterações de sentido ao se passar de um suporte a outro (Chartier).

C - Escrever uma vida: a produção de textos biográficos e autobiográficos.
A cronologia, os perfis biográficos, a biografia e a história como formas de ler e escrever a “vida-e-obra”. Pacto autobiográfico (Lejeune) e autoficção (Colonna). O novo biografismo e o ressurgimento da biografia nos estudos acadêmicos (Dosse).

BIBLIOGRAFIA:
A bibliografia específica musical será fornecida em classe, a partir das temáticas dos projetos dos alunos matriculados.

ALBERTI, Verena. Literatura e autobiografia: a questão do sujeito na narrativa. Rio de Janeiro. Estudos Históricos, v. 4, n. 7, 1991, p. 66-81. Link
BARTHES, Roland. A morte do autor. In: O rumor da língua. Trad. Mário Laranjeira. São Paulo: Editora Brasiliense, 1998. Link
BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. 3ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: AMADO, J; FEEREIRA, M;M; Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas editora, 1996. Link
______. Esboço de auto-análise. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
CERTEAU, Michel de.  A Escrita da História. Tradução de Maria de Lourdes Menezes. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006, p.272-273. Link
CHARTIER, Roger. História cultural entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990. Link
______. O mundo como representação. São Paulo. Estudos avançados, 5, 11, abril de 1991, p. 173-191. Link
______. Cultura escrita, literatura e história. Porto Alegre: Artmed, 2001.
COLONNA, Vincent.  L’Autofiction. Essai sur la fictionnalisation de soi en littérature. Thèse (Doctorat ) dirigée par Gérard Genette, EHESS, 1989. Link
DOSSE, François. O Desafio Biográfico: escrever uma vida. Tradução de Gilson César Cardoso de Souza. São Paulo: EDUSP, 2009.
FOUCAULT, Michel. O que é um autor?. Lisboa: Vega, 2002.Link
GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes. Tradução de Maria Betânia Amoroso. São Paulo: Cia. das Letras, 1987.
______ O fio e os rastros:  Verdadeiro, falso, fictício. Tradução de Rosa Freire d Aguiar e Eduardo Brandão. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
GOEHR, Lydia. The imaginary museum of musical works: an essay in the Philosophy of Music. Oxford: Oxford University Press, 1992.
IGAYARA-SOUZA, Susana. Entre palcos e páginas: a produção escrita por mulheres sobre música na história da educação musical no Brasil ( 1907-1958) Tese (Doutorado em Educação) São Paulo. Faculdade de Educação da USP 2011. Link
IGAYARA-SOUZA, Susana. Henrique Oswald (1852-1931): A Missa de Réquiem no conjunto de sua música sacra coral. Dissertação (Mestrado em Artes). São Paulo: Escola de Comunicações e Artes da USP. 2001. 
LE GOFF. Memória e história. São Paulo: Editora da Unicamp, 1990.
LEJEUNE,Philippe. Le pacte autobiographique, Paris, Seuil, 1975. Link para o website autopacte
______Je est un autreL'autobiographie, de la littérature aux médias. Paris, Seuil, 1980. 
LEVI, Giovanni. Usos da biografia. In: AMADO, J; FEEREIRA, M;M; Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas editora, 1996.
NORA, Pierre. Entre memória e historia: a problemática dos lugares. São Paulo.  Revista Projeto História,  n. 10, p. 7-28, dez/1993.Link
RICOUER, Paul. A Memória, a história e o esquecimento. Tradução: Alain François. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2007.
SAMSOM, Jim. The Cambridge History of Ninettenth Century Music. Cambridge: Cambridge Universityu Press, 2002.
SHMIDT, Benito Bisso. Construindo biografias... Historiadores e Jornalistas: aproximações e afastamentos. Rio de Janeiro: Estudos Históricos, n. 19, 1997. p. 1-17.  
VIÑAO FRAGO, Antonio. Las autobiografias, memorias  diarios como fuente histórico-educativa: tipologia y usos. Rio de Janeiro. Teias. Faculdade de Educação. UERJ, ano 1, n. 1, 82-97, jan-jun 2000. Link
______. Relatos e relações autobiográficas de professores e mestres. In: MENEZES, Maria Cristina (org). Educação, Memória, História:  possibilidades, leituras. Campinas: Mercado das Letras, 2004.

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO:
Participação em aula (seminários, discussão e produção de textos) e monografia final.